A entrevista da minha vida

Começaremos nossa conversa fazendo uma breve reflexão em relação as entrevistas que você já participou. Neste momento, pense na melhor e mais agradável entrevista que já participou. Conseguiu lembrar rapidamente? Eu levei muitos anos para ter uma resposta positiva para essa pergunta. Encontrar um lugar no qual pudesse ser respeitada, ter uma entrevista com dignidade, respeito e que soubessem lidar com a minha diversidade e personalidade foi raridade.

Para entrevistas, a recomendação era sempre seguir a tradição, que tinha raízes profundas em achismos, crenças e estereótipos que sempre ecoavam por meus ouvidos, percorriam a minha mente e reverberavam em meu ser, que as repelia sem entender o motivo. Tradicional? Eu?

Aprendemos muito cedo que adequar-se é fundamental e necessário: usar a roupa “adequada”, o cabelo que deveria seguir parâmetros rígidos eurocêntricos, além de ter o mesmo estilo e paleta de cores na vestimenta. Essa persona eu tive que criar, pois um mundo sem sorrisos, cores, brilho e personalidade não me era familiar.

E esse famoso “padrão tradicional” é imposto até hoje por muitas organizações com a desculpa sobre bons costumes e etiqueta, e afetam pessoas negras, principalmente mulheres negras. Esse assunto é pauta cotidiana. Estudos indicam que quase metade das mulheres negras sofreram racismo em entrevistas de emprego e uma pesquisa global, divulgada pelo LinkedIn, mostrou que os cabelos de mulheres negras têm 2,5 vezes mais chances de serem percebidos como “não profissionais”.

Outro fator consequente do racismo é o de que duas em cada três mulheres negras alisaram o cabelo para ir à uma entrevista de emprego. Segundo a Pesquisa no Local de Trabalho – Crown 2023, o medo de não ser bem-sucedida nos processos seletivos acomete 54% das mulheres negras. Aliás, 25% acreditam que foram reprovadas em uma entrevista por este motivo.

A reflexão que deixo aqui é: um cabelo realmente define o potencial, qualidade e resultados na atuação das mulheres negras? Nenhum estudo mostra tal correlação.

Você é parte da solução ou do problema? Com este conhecimento em mente, qual transformação você vai implementar em seus processos seletivos, entrevistas e políticas organizacionais? Menos discurso e mais ação, por favor!

Por Camila Freitas.

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